É possível ter Jorge Mendes a gerir na sombra e ainda ter dificuldades colectivas. Para além do Valência, que atravessa período complicado após a chegada de Peter Lim, agora é a vez de Wolverhampton se debater com dificuldades. Desde a vitória sobre Nottingham Forest (1-0) a 15 de outubro, os lobos não mais conseguiram triunfar na Premier League. Mas em vez de se virarem para Portugal como parecia ser o costume (Nuno Espírito Santo e Bruno Lage foram os últimos treinadores), o clube inglês foi procurar uma solução em Espanha. Despedido pelo Sevilha após um desastroso início de temporada, Julen Lopetegui já tinha acordado um futuro com o Wolverhampton. Um pequeno pormenor já que o agente do antigo treinador do FC Porto é, quem mais, Jorge Mendes.
Mas mais do que o antigo treinador da seleção de Espanha, é a chegada de Fran Garagarza que é interessante.
Garga quem?
Durante 17 anos, Fran Garagarza foi a pedra angular do Eibar: treinador dos juniores, adjunto, director responsável pela formação e chefe do departamento de prospeção. O pequeno clube basco pode ter sido relegado para a segunda divisão espanhola, mas a força económica dos armeros deve-se em parte ao recrutamento inteligente que permitiu ao clube manter a sua posição e existir no futebol ibérico. Marko Dmitrovic, Dani García, Yuri Berchiche, Bebé, Joan Jordan, Marc Cucurella, Rubén Peña, Bryan Gil, Arnaitz Arbilla, Florian Lejeune, Pedro León, Takashi Inui, Keko Gontán, Borja Bastón, Pere Milla, Iván Alejo, Fran Rico, Cote, Charles, Fabián Orellana, Edu Expósito... A lista de boas contratações é longa e atesta a capacidade de escolher os perfis certos para uma equipa.
Durante vários meses, o basco e os seus dois adjuntos têm feito uma digressão pela Europa: "Temos estado a trabalhar com o Sevilha, Bétis e Real Madrid", explicou ele março ao diário AS, completando: ''Agora estamos a visitar Sporting, Eintracht Frankfurt e RB Leipzig. Observámos muito futebol espanhol, sobretudo ao nível da formação''.
Após o anúncio da sua saída, Garagarza foi o foco de vários rumores para se juntar aos clubes do segundo escalão de Espanha. Levante, Oviedo e Saragoça estavam todos na corrida mas foi Julen Lopetegui quem finalmente convenceu o homem de 56 anos a juntar-se a ele em Inglaterra.
Uma missão condenada ao fracasso?
Recrutar alguém deste calibre é uma coisa. Tê-lo a coabitar com Jorge Mendes é outra. Nem que seja porque existe uma diferença ontológica na forma como Garagarza funciona e que não parece encaixar no modo de atuar do superagente.
Numa entrevista ao the Guardian em dezembro de 2020, Garagarza explicou a abordagem ao investimento financeiro no Eibar: "No ano passado, por exemplo, vendemos bem, Joan Jordán a Sevilha por 12 milhões de euros e Rubén Peña a Villarreal por oito, mas nunca gastámos tudo o que ganhámos. Não são apenas os valores das transferência, são também os salários, o equilíbrio, a gestão das renovações e aumentos que são as tarefas mais difíceis. O dinheiro não é tudo''. Em resumo: uma forma de pesnar diferente de Jorge Mendes.
Num clube que faz mais colocação de produtos do que o recrutamento real, é difícil ver como é que o recém-chegado Observador Técnico se vai encaixar no organigrama dos lobos juntamente com Mathew Hobbs, o actual director de recrutamento. Em Valência, por exemplo, embora Pablo Longoria possa ter sido uma figura relativa, não era preciso um observador atento do clube espanhol para perceber que Miguel Ángel Corona é o actual director desportivo e que não pôde fazer muito para reter Gonçalo Guedes este verão (mudou-se para o Wolverhampton). A transferência foi um sucesso para o clube espanhol, mas o jogador acabou por dispor de poucos minutos e não vai ao Mundial-2022 pese embora a excelente época que fez em Espanha.
Em resumo, Garagarza é conhecido pelo seu trabalho numa pequena estrutura que tem dependido fortemente de empréstimos para se manter na LaLiga. Não será o mesmo em Wolverhampton, especialmente porque os desejos de Mendes terão precedência. Enquanto se via a si próprio a regressar principalmente a um clube espanhol, o basco optou por ajudar a espanholizar um clube com um ADN predominantemente lusófono. À primeira vista, esta é uma missão muito complicada.